domingo, 1 de abril de 2012

O canal é o Brasil

Vez e sempre uma surpresa agradável e não é por menos.. De bobeira, captamos o “Sem Frescura”, programa conduzido pelo irreverente Paulo César Peréio, que entre um gole e outro (de um bom uísque ou qualquer coisa do gênero) leva um papo descontraído e permissivo. Acompanhamos ele papeando com Paulo Tiefenthaler. Não foi bem uma entrevista, porque a conversa poucas vezes convergia. Era um pra lá e outro pra cá, às vezes simultaneamente. “É sem frescura, porra”, diz Peréio na chamada de abertura do programa que resiste diante da mediocridade da televisão brasileira.

Peréio tem uma das vozes mais bonitas do Brasil, e também das mais requisitadas para locução, mas quando está no seu programa não é fácil entende-lo. E Tiefenthaler não fica nadica pra trás. Eles pareciam dois trogloditas vociferando grunhidos guturais, ininteligíveis. Um intelectual diria que foi um diálogo visceral, primevo. Quando entendíamos as opiniões e pontos de vista eram agressivas, mas verdadeiras. Tocavam fundo na ferida e na baboseira a que somos expostos, em todos os sentidos, se não tivermos chance ou paciência pra garimpar produções artísticas interessantes e autênticas.





 
O jeitão do Peréio é conhecido: grosso, sem educação, prepotente, irônico e outros mil adjetivos. Pra comemorar seus 70 anos de idade e 50 anos de carreira ganhou até um anti-documentário (a pedido): “Peréio eu te odeio”, dirigido por Allan Sieber, cartunista. Pra falar mal de Peréio não houve problemas, ele fez uma lista com familiares, amigos e inimigos e cedeu para orientar o diretor. Os familiares e amigos adoraram depor seu desprazer em conhecer ou ter convivido com ele. Alguns inimigos recusaram, seria o “gozo” para o ego do artista.  


Já escrevemos aqui no Tyrannus sobre o Paulo Tiefenthaler, discorrendo sobre seu jeitão despojado e o curioso programa de “culinária de guerrilha”, o Larica Total. Conversei com o André Sadi, quando ele aqui esteve no Festival de Cinema de Cuiabá, cobrando-lhe o retorno do Larica. “Ele vai voltar...”, garantiu. E já na próxima terça, rola no Canal Brasil, o making off da reestreia do Larica.

Aí, acabou o Sem Frescura e, ainda de bobeira, no mesmo Canal Brasil mais um documentário: “Canções do Exílio, a labareda que lambeu tudo”. Nome estranho e esperamos pra ver qual era. O doc, dirigido pelo jornalista Geneton de Morais, com Caetano, Gil, Mautner e Macalé. Presente também o Glauber, com seu vozeirão. E quem faz a narração? Quem...? Quem...? Ele, o odiado Peréio. Foi muito Peréio para uma tarde domingueira, mas valeu. Há quem prefira Faustão, Gugu, Eliana etc... Cada um com as suas preferências. Acreditamos que a força do hábito congelou as mãos ou cérebro  ou sei lá mais o que das pessoas que não con$eguem buscar outras opções.  

Caetano e Geneton
 


Bueno, o bacana na produção do Geneton é a ligação de antigos depoimentos, basicamente de Gil e Caetano, nos tempos em que eles foram presos e depois convidados ao exílio, com entrevistas atuais. Lá pelo final dos anos 60, começo dos 70.



 



“Ouvi eles dizendo várias vezes que queriam matar o Vandré”, diz Caetano, referindo-se aos contatos imediatos que travou com a polícia do exército, durante os anos de chumbo. E Gil, enquanto preso, não negou uma “canja” aos soldados e oficiais e numa noite rolou um showzinho bacana.


"Eu fui muito feliz, completamente triste" (Macalé)

É sempre legal recordar episódios da história (neste caso, não oficial) brasileira. Uma sacada interessante do Geneton é que em parte do texto ele, que foi e ainda é jornalista, desce a lenha nessa profissão, nas suas regras, suas restrições e pusilanimidades. Mas, salvaguarda o ofício, valorizando pelo menos um lado bom: o de produzir a memória.






Coincidentemente a data do “golpe” foi sábado, 31 de março. Tá rolando uma discussão braba, sobre o “direito do esquecimento”. Muito antes o General João Batista de Figueiredo ao deixar a presidência, pediu: “Esqueçam de mim”. Têm fatos e coisas que um povo não pode nem deve esquecer!



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